Uma parceria entre uma equipe de quatro pesquisadoras da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e a Universidade de Princeton (EUA), por meio do hub Brazil Lab, está identificando e mapeando os assentamentos humanos pré e pós-colombianos na Amazônia. O trabalho tem apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa e Extensão Universitária (Fapeu). “O papel da Fapeu é importante por vários motivos. Toda ajuda é muito valiosa, mas tem essa questão da burocracia de receber dinheiro, especialmente de fora. E a Fapeu tem essa expertise, faz essa gestão. Outra coisa é ao longo do processo estar sempre disponível para ajudar e auxiliar de forma muito rápida. Tem toda uma burocracia envolvida, e o pesquisador não pode fazer bobagem e depois ficar pendente na prestação de contas. Acho o trabalho da Fapeu fundamental para o pesquisador. Cada um faz sua parte: quem foi treinado para fazer gestão faz a gestão, e o pesquisador, pesquisa”, define a professora Marina Hirota, coordenadora do projeto.
Financiador do trabalho, o Brazil Lab é uma iniciativa da Universidade de Princeton para promover a interação de pesquisadores brasileiros com professores da instituição norte-americana, constituindo-se em um hub de criatividade, de geração e realização de ideias. Iniciado em fevereiro de 2021, o projeto desenvolvido na UFSC também conta com apoio da equipe do professor Lucas Bueno, do Laboratório de Estudos Interdisciplinares em Arqueologia da UFSC, que construiu o banco de dados Brazilian Radiocarbon Database – BRC14Database, e com a Amazonian Archaeological Sites Network (AmazonArch), uma rede de pesquisa internacional que compartilha dados e informações sobre sítios arqueológicos distribuídos pela Amazônia.
O objetivo principal do projeto é gerar um mapeamento da Amazônia inteira, a partir dos dados coletados e estudos individuais e agregados, e disponibilizar essas informações de forma pública e aberta, além de agregar camadas de informação aos sítios pós-colombianos. "Como os objetivos do grupo de trabalho do professor Lucas coincidem com os da rede AmazonArch, a ideia é uniformizar esse mapeamento para que no futuro consigamos unir e alimentar as bases de dados de maneira combinada e integrada. A meta é que esta base nos informe como se deu no tempo e no espaço o povoamento da Amazônia, quais povos eram, que tipo de atividade eles exerciam, se cerâmica, se confecção de algum artesanato em barro”, cita a professora Marina Hirota. Além dela, também participam da pesquisa a pós-doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Ecologia da UFSC, Carolina Levis; a mestre em Ecologia pela UFSC, Gessica Minski; e Ana Paula Faggiani, graduanda do curso de Meteorologia, onde Marina é docente.
Futuro
Da triangulação geográfica entre Santa Catarina; o Estado de Nova Jersey, onde fica Princeton; e a Amazônia, a meta é que brotem mais informações sobre a história do território amazônico e o passado ajude a preservar o futuro da floresta. “A sociedade poderá conhecer um pouco mais da história da Amazônia e, principalmente, para os dias atuais entender que a interação do ser humano com a biosfera, neste caso com a Amazônia, é muito harmônica e muito positiva para a determinação do que a gente vê hoje na Amazônia, na distribuição de diversas espécies de plantas”, observa Marina, citando o exemplo da castanheira.
“A castanheira é uma espécie que produz a castanha-do-pará e foi domesticada, por essa questão da etnoecologia, da interação humana na delineação de ambientes naturais. Muitas espécies hiperdominantes na Amazônia, como a castanheira, são domesticadas e esses povos que trabalhavam, que usavam a castanheira foram aos poucos modificando a espécie, plantando-as mais próximas do sítio onde viviam para fazer uso das folhas, do fruto, da casca, de várias coisas da castanha”, observa Carolina Levis.
E, esse movimento, explica a pesquisadora, moldou não só a Amazônia, como outros biomas do Brasil e do mundo. “Isso moldou muito o que a gente vê hoje, mas de uma forma positiva, com uma interação positiva e não destrutiva, que é o que a gente está observando mais nos dias de hoje. Então, é possível extrair da floresta mantendo a floresta em pé e fortalecendo e valorizando esses povos originários que ainda existem na Amazônia. E não com os incêndios intensos e o tanto de desmatamento que não mantêm a floresta em pé. Essa é a principal mensagem que queremos passar para a sociedade”, define Carolina, doutora em Biologia pelo Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia, onde, em 2018, apresentou o trabalho com o título 'Domesticação das Florestas Amazônicas'.
Esses indícios de movimentação são importantes para o mapeamento pré-colombiano, ou seja, até 1492, quando da chegada de Cristóvão Colombo à América. Deste período, os povos mais conhecidos são os incas, maias e astecas, que habitavam em territórios diferentes e nunca teriam convivido. Um dos trabalhos desenvolvidos até agora pela equipe foi classificar os muitos povoamentos indígenas pré-colombianos de acordo com as características marcantes das atividades desses povos. Assim foram chamados de “obras de terra”, “conchífero”, “lítico”, “cerâmico”, “artes rupestres”, “terra preta de índio”, “megalito” e “cemitério”. "Nós determinamos qual seria a classificação dos sítios em oito tipos principais para uniformizar e padronizar essa classificação ao longo da Amazônia; e posteriormente com outros bancos de dados", explica Carolina.
Terras não destinadas
Para o período pós-colombiano já existe uma série de estudos feitos pelo IBGE, Funai ou Ministério do meio Ambiente, por exemplo, que aponta para classificações como comunidades tradicionais, indígenas, produtores rurais pequenos, médios e grandes espalhados por terras demarcadas, unidades de proteção, unidades de conservação. A equipe atualmente faz uma análise desses dados oficiais e de outros órgãos para a formação de um grande banco de dados organizados e abertos.
“São várias camadas de informação. Hoje tem plataformas que disponibilizam que tipo de terra é aquela, se é para agricultura ou outros fins. A partir destes mapas, a gente consegue ver assentamentos pós-colombianos e ter acesso a partir do censo do IBGE onde há reconhecimento legal”, observa a professora Marina Hirota, coordenadora do projeto. Essas são as terras destinadas, mas há também as terras não destinadas. “Isso é um problemaço porque são terras da União, mas são terras que abrem brecha para atividades ilegais de desmatamento, por exemplo. Se você desmata uma área não destinada, depois você pode ir lá e fazer usucapião e todo o processo de legalização para o seu nome”, lamenta.
Os pesquisadores de uma forma geral veem essa questão das terras não destinadas como um problema “muito grave”, como se houvesse um vácuo legal no espaço amazônico. Um levantamento do primeiro semestre de 2020 realizado pelo Instituto Pesquisa Amazônia (Ipam) e pelo Núcleo de Altos Estudos Amazônicos (NAEA) da Universidade Federal do Pará (UFPA) apontou que a Amazônia tem 23% de floresta em terras públicas não destinadas registradas ilegalmente como propriedades privadas. “É quase uma brecha legislativa para o avanço do desmatamento da Amazônia”, lamenta a coordenadora do trabalho. E é com a descoberta da presença de povos pré e pós colombianos nestes locais, reservando essas áreas para a história, que o grupo quer ajudar a manter a florestas amazônicas cada vez mais resilientes e com um desenvolvimento cada vez mais sustentável.
PROJETO: MAPEAMENTO DOS ASSENTAMENTOS HUMANOS PRÉ E PÓS-COLOMBIANOS NA AMAZÔNIA / COORDENADORA: Marina Hirota / marina.hirota@ufsc.br / UFSC / Departamento de Física / CFM / 4 participantes
Foto: Carolina Levis
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